sexta-feira, janeiro 05, 2007

ANÁLISE - A ELEIÇÃO NA CÂMARA

Por Ricardo Amaral e Natuza Nery

BRASÍLIA (Reuters) - A disputa entre os deputados Aldo Rebelo (PCdoB-SP) e Arlindo Chinaglia (PT-SP) pela presidência da Câmara é parte importante, mas apenas parte, de um contencioso entre o Partido dos Trabalhadores e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tem como pano de fundo a sucessão presidencial em 2010.

"As relações entre o presidente e o PT nunca estiveram tão desequilibradas. Com o enorme apoio popular que recebeu nas eleições, Lula está impermeável às reivindicações do partido", disse à Reuters um dirigente petista que pediu para não ser identificado.

O partido quer de volta o Ministério da Saúde, que Lula entregou ao PMDB e planeja manter com seu maior aliado. Além disso, petistas temem a diluição de sua identidade num governo de coalizão ampla, com um presidente carismático, que tem apoio da maioria dos movimentos sociais independentes dos partidos.

"O segundo mandato não é o começo da aposentadoria política de Lula. Ele vai influir na sucessão para dar continuidade a esse projeto político, que não inclui apenas o PT mas todas as forças que apóiam o governo", disse um ministro petista, também na condição de anonimato.

Embora a maioria da bancada do PT na Câmara esteja apoiando Chinaglia, há uma disputa interna pela direção do partido, que deve ser renovada ainda este ano e vai influir decisivamente na escolha do candidato à sucessão de Lula.

O PT não tem um nome natural para 2010, mas três "balões de ensaio" flutuam sobre o partido: a ministra Dilma Roussef, como nome "do Planalto"; a ex-prefeita Marta Suplicy, representando a "velha ordem" da máquina partidária, e o governador Jaques Wagner, pela corrente que se fortaleceu na crise de 2005.

E os problemas do PT não se restringem a disputas internas. Lula pode sacar seu candidato de um dos partidos da coalizão. Ele já contava com Ciro Gomes, do PSB, e agora tem Sérgio Cabral (PMDB), novo e privilegiado aliado, com o potencial do governo do Rio para se projetar nacionalmente. "O problema da sucessão está na cabeça de todo petista desde o dia da reeleição, principalmente pela possibilidade de Lula apostar em um aliado", disse o dirigente que diagnosticou o "desequilíbrio" na relação com o Planalto.

PECADO ORIGINAL

Na presidência da Câmara, o PT poderia reequilibrar essa relação. O posto daria ao partido o controle sobre a agenda legislativa, numa safra de reformas, e sobre um orçamento anual de cerca de 2 bilhões de reais.

A conquista da Câmara também daria ao partido um papel mais relevante na coalizão de governo -- onde o PMDB é o maior entre dez partidos -- e o segundo lugar na linha de substituição de Lula, logo depois do vice José Alencar.

Lula esperava uma tranquila reeleição de Aldo Rebelo e encarava a candidatura Chinaglia como um movimento tático do PT para pressioná-lo a garantir e, se possível, ampliar espaços no governo, em disputa com os partidos da coalizão.

"O cálculo político era que o Chinaglia se contentaria com um ministério, mas a disputa avançou tanto de lá para cá que esse tipo de solução pode ter se inviabilizado; ficaria uma imagem de fisiologismo", disse um político aliado.

Nesta quinta-feira, um dia depois de terem sido recebidos separadamente por Lula, tanto Chinaglia quanto Rebelo negaram enfaticamente a hipótese de qualquer um deles sair do páreo em troca de um cargo na Esplanada.

O estrago provocado pela disputa pode se estender ao PMDB, que também se divide entre as duas candidaturas. O presidente do partido, deputado Michel Temer (SP), tende a apoiar Chinaglia; Aldo é ligado ao grupo do presidente do Senado, Renan Calheiros (AL).

A candidatura de Chinaglia foi estimulada também pelo ex-ministro José Dirceu. O ex-ministro planeja apresentar um projeto de iniciativa popular propondo sua anistia (ele foi cassado como deputado em 2005) e quer contar, para isso, com um aliado na presidência da Câmara.

Lula não tentou impedir a candidatura de Chinaglia quando isso seria mais fácil e agora se queixa do estrago que a disputa pode provocar na coalizão, dividindo os partidos e especialmente o PMDB.

Segundo um político aliado, Lula disse que o pecado original de Chinaglia foi lançar seu nome pelo PT. "Se ele queria o lugar do Aldo, deveria ter construído a candidatura pela base do governo, não por um partido", teria dito Lula.

PT SEM PELÉ

Desde a campanha da reeleição, Lula procurou manter uma relação institucional e mais organizada com o PT. Ele vem fazendo reuniões periódicas com a direção do partido e com o conselho político, que congrega as correntes internas.

Em público, no entanto, parecem cada dia mais distantes. Nos dois discursos da segunda posse, em 1o de janeiro, o PT sequer foi mencionado, ao contrário do que ocorreu em 2003.

"Ele não citou o PMDB, PCdoB, PSB, PDT. Por que iria citar o PT se está criando um governo de coalizão", questionou o ministro petista do Planejamento, Paulo Bernardo.

Para o PT, os ministros da coordenação de governo (Justiça, Casa Civil, Secretaria-Geral, Relações Institucionais e Fazenda) são da cota pessoal de Lula. O partido quer mais ministros nas áreas social e de infra-estrutura, mas dificilmente conseguirá.

"Ganhei as eleições com esse ministério, que foi aprovado pelo povo. Não estou vendo nenhum Pelé no PT que me obrigue a mudar a escalação", disse Lula, recentemente, a um amigo que perguntou sobre a reivindicação petista.

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